Skip to content Skip to left sidebar Skip to right sidebar Skip to footer

Esboço histórico-geográfico do aglomerado de Caldas das Taipas

O aglomerado de Caldas das Taipas, inserido na freguesia de São Tomé de Caldelas, concelho de Guimarães, corresponde a uma área aplanada do vale do Ave onde desaguam o rio da Agrela e a ribeira da Canhota. Contudo, a topografia apresenta-se contrastada, como o denotam as grandes alturas do Sameiro, da Falperra, da Morreira, do Outeirinho e das estações arqueológicas de Sabroso e da Citânia de Briteiros, cujos contrafortes se anunciam já nas proximidades da Vila.

A própria situação geográfica deverá ter sido um factor que contribuiu decisivamente para o crescimento do aglomerado; na margem direita do curso do rio Ave – onde este se estreita em meandros – atravessando longitudinalmente quase toda a freguesia de Caldelas. Também se encontra posicionado no cruzamento de artérias tão importantes como sejam aquelas que ligam Braga (15 km) com Guimarães (7 km) e outras ramificações que se estendem pelo vale do Ave, como Famalicão (22 km), Vizela (16 km) e Póvoa de Lanhoso (14 km), não se encontrando muito afastada do núcleo urbano do Porto (55 km).

Esta povoação foi povoada desde tempos imemoriais visto existirem vestígios de pequenos castros nas serranias das redondezas de povos autóctones anteriores aos próprios Lusitanos. Será porém com a Romanização, que a actividade termal se inicia devido ao aproveitamento das nascentes aqui descobertas. Esta característica conduziu ao desenvolvimento de um pequeno aglomerado em termos demográficos, porém com um certa importância como o demonstram alguns dos seguintes vestígios arqueológicos: a via militar; os balneários romanos; a Ara de Trajano (classificada de Monumento Nacional). Estas estruturas permitiram desde cedo iniciar uma forte ligação entre o povoado e a potencialização dos recursos naturais do meio envolvente. Em simultâneo, a via militar romana que aqui entroncava, deverá ter privilegiado as acessibilidades de um pequeno aglomerado, factor que desde sempre condicionou o crescimento demográfico e económico de toda esta área envolvente.

No século XV, na freguesia de São Tomé de Caldelas, a Colegiada de Guimarães usufruía de renda duas galinhas pelo Casal da Taipa, que trazia emprazada Vasco Afonso.

Durante a Idade Moderna, salienta-se como facto mais notável a construção de uma ponte sobre o rio Ave (classificada de Monumento Nacional) que aproximaria a freguesia de Caldelas à sede do município, complementando a ligação viária entre Braga e Guimarães. Posteriormente, em 1867, foi construída uma nova ponte de granito com três arcos redondos, situada mais a montante do referido curso de água. nos meados do século XVI, no lugar da Taipa, foi edificada a Capela de Santo António, posteriormente reconstruída entre 1692 e 1695. Em 1917, este pequeno templo foi demolido, devido a critérios de ordenamento urbanístico que na época se realizaram nesta povoação.

As termas só foram redescobertas em 1753 por Cristóvão dos Reis, frade carmelita e administrador da botica do seu convento em Braga, que chamou a atenção para as virtudes terapêuticas das águas minero-medicinais. Até ao início do século seguinte, os banhos termais eram tomados em poços cavados na terra e cobertos com ramos de carvalho. Apenas se construíram algumas barracas de madeira, mais para evitar os atentados ao pudor do que propriamente para comodidade dos aquistas.

Em face das precárias condições de utilização das nascentes termais, em 1818, a Câmara Municipal de Guimarães resolveu expropriar a área situada no campo do Tapadinho para aí construir um pequeno balneário para o qual era canalizada a água captada em cinco nascentes diferentes. Entre 1844 e 1867, as obras em curso puseram a descoberto a quase totalidade das ruínas dos balneários romanos cujo ladrilhado de grandes tijolos foi reutilizado na edificação das novas infra-estruturas termais.

Sensivelmente nesta época, na primeira quinzena do mês de junho de 1860, o escritor Camilo Castelo Branco envolvido em amores ilícitos com Ana Plácido, encontrava refúgio nesta localidade devido à protecção do seu amigo Francisco Martins Sarmento. Foi neste período acidentado da vida do romancista, que o arqueólogo vimaranense lhe arranjou alojamento numa casa vizinha do Grande Hotel Vilas e próxima dos “Banhos Velhos”. O literato enquanto se encontrava nas Taipas, dava passeios de barco no rio Ave com Martins Sarmento, apreciava as frescas carvalheiras, frequentando por vezes, os bailes da Assembleia, apesar do receio de ser reconhecido.

Em 1874, no mesmo local iniciou-se a construção de um novo edifício de forma dodecagonal, que foi inaugurado a 11 de julho de 1875. A crescente importância da exploração das águas termais pela Câmara de Guimarães, está patente pelo facto de terem sido expostas na Exposição Industrial de Guimarães (1884).

O cemitério paroquial foi construído em 1891, sendo o primeiro enterramento realizado a 8 de maio desse ano. Em 1910, o Conde de Agrolongo determina a expensas suas a construção da atual igreja matriz, que se prolonga por cinco anos, segundo o projeto de João de Moura Eça Coutinho. Poucos dias após a inauguração da Igreja Paroquial de Caldelas, era inaugurado em Braga (21 abril 1915) o Teatro Circo, projetado também por João de Moura Coutinho de Almeida Eça.

Em 1905, a Câmara Municipal de Guimarães aprovou a proposta de arrendamento do Estabelecimento Termal das Taipas. A 18 de abril de 1906, José Antunes Machado morador nas Taipas, arremata pelo lance mais elevado, estipendiado em 520$000 réis anuais a concessão da exploração industrial e comercial das nascentes de águas termais durante 18 anos renováveis por 4 períodos iguais. Nos três anos seguintes, o aludido concessionário vai dar início à implementação de uma série de infra-estruturas como sejam uma “buvette” de captação e distribuição das águas minero-medicinais e de um moderno balneário (designado de “Banhos Novos”).

No entanto, José Antunes Machado depressa cede os direitos de exploração a um consórcio denominado Empresa Termal das Taipas S.A.R.L. criado por escritura pública de 4 de maio de 1910 com todos os direitos e obrigações constantes do contrato celebrado em 1906. Porém, em abril de 1915, procede-se a uma alteração nos termos do contrato, ficando estipulado que em caso de rescisão do acordo, a Empresa Termal ficava obrigada a entregar todas as instalações termais, salvaguardando todos os terrenos e edificações adquiridos a partir dessa data. Este documento foi celebrado, certamente já com a intenção por parte dos accionistas da Empresa, de construir uma unidade hoteleira com vista a potencializar os recursos hidrotermais. Será por conseguinte, uma data relevante para o fomento do turismo termal nas Caldas das Taipas, pois inicia-se a 3 de Outubro do mesmo ano a construção do Hotel das Termas, da autoria do arquitecto portuense Eduardo da Costa Alves. A Primeira Guerra Mundial originou a carestia de materiais e a falta de operários, provocando assim sucessivos atrasos na construção da última ala desta unidade hoteleira, que apenas ficaria concluída em 1923.

A dinâmica do termalismo Taipense está bem patente no conforto deste hotel, frequentado por ilustres visitantes ligados à vida cultural e política da época. Destaca-se o presidente da República General Óscar Fragoso Carmona que aí esteve hospedado com a sua família, aquando do evento das Comemorações do Duplo Centenário em Guimarães (1940). Outra personalidade de relevo é o escritor Ferreira de castro que desde a década de 60, passava as suas férias no seio desta povoação minhota, hospedando-se neste mesmo hotel, onde mantinha uma escrivaninha de trabalho. Um ano após do lançamento da primeira pedra do Hotel das Termas, o Grande Hotel Vilas edificado na 2ª metade do XIX, sofre importantes obras de ampliação. Com 23 quartos, funcionaria até ao início da década de 90, do século XX. As restantes unidades hoteleiras das Caldas das Taipas, o Hotel Braga e o Grande Hotel das Taipas teriam uma duração efémera, encerrando na década de 30 do século passado, sofrendo a concorrência do Hotel das Termas, ainda hoje em atividade.

Pelo Decreto-Lei nº27424, de 31 dezembro 1936, em substituição das Comissões de Iniciativa são criadas as Juntas de Turismo. Imediatamente é formada a Junta de Turismo da Estância Termal das Taipas, que nas décadas seguintes, irá proceder à construção das seguintes estruturas: ringue de patinagem (1938), palco dos jogos do “Turismo-Hoquei Clube de Caldas das Taipas”; piscinas para adultos e crianças (1950); parque infantil; campos de ténis (1948); parque de campismo e de um posto de turismo. Com estes equipamentos, esta vila transformou-se nas décadas de 50 e de 60 do século XX, num importante e dinâmico centro turístico e desportivo no norte de Portugal.

Em 1985, a Câmara Municipal de Guimarães rescindiu o contrato que outorgava a concessão da exploração das águas termais à Empresa Termal das Taipas. No ano seguinte, a autarquia forma a Taipas-Turitermas-Cooperativa de Interesse Público de Responsabilidade Limitada com o propósito de assumir a gestão e a modernização do estabelecimento termal e dos equipamentos turísticos existentes, estes últimos até então dependentes da Junta de Turismo das Taipas.

Terá sido a localização geográfica e o turismo termal que induziram ao surgimento de uma diversidade de atividades ligadas ao pequeno comércio, serviços e mais tardiamente à indústria. Contudo, não podemos deixar de salientar a existência da realização na localidade de uma feira mensal (1ª segunda-feira de cada mês) pelo menos desde 1842, que no início da centúria seguinte se tornou semanal, o que fundamenta uma certa vitalidade económica das Caldas das Taipas e do seu aro envolvente. Também se realizava uma importante e concorrida feira franca que coincidia com as festividades anuais em honra de São Pedro.

A partir da década de 1950, a expansão industrial que se verificou um pouco por todo o país, terá tido também alguns reflexos nesta localidade, como seja a modernização tecnológica e ampliação de unidades fabris já existentes (cutelarias e têxteis), a par do surgimento de outras (confecções e malhas, calçado, embalagens e construção civil e afins) com um dinamismo empresarial adequado aos novos tempos.

A implementação da diversidade de serviços públicos e privados são a prova de uma certa especialização do sector comercial e industrial, com destaque para o turismo e as atividades que se encontram a montante e especialmente a jusante, capazes de por si mesmas darem um cunho urbano a um aglomerado que não tendo relevância administrativa à partida estaria condenado a um ostracismo de feição ruralizante como a maioria das freguesias do concelho. O desenvolvimento económico-industrial foi o factor condicionante que permitiu a elevação do estatuto do aglomerado a Vila (1940), numa época em que poucos núcleos populacionais do Vale do Ave ostentavam este título.

Nas últimas três décadas, a estrutura morfofuncional do casco urbano sofreu profundas transformações. A abertura de novas artérias, onde se procedeu à urbanização acelerada foi acompanhada de uma diversificação versus dispersão, sem precedentes das atividades relacionadas com o comércio e os serviços. Assistiu-se ao surgimento de funções especializadas, essencialmente do domínio do comércio que aos poucos vão substituindo como fonte empregadora a agricultura e a pequena indústria. Os exemplos mais emblemáticos situam-se no domínio da atividade comercial (floristas, “fast-food”, foto/vídeo, informática, stands de automóveis) e serviços privados (escolas de condução, agências imobiliárias, centros de explicações, gabinetes de advocacia, oculistas e clínicas médicas). Estas actividades deixaram de se concentrar quase exclusivamente na artéria principal (Av. da República) para se repartirem por outras ruas, mas notando-se uma nítida preferência por outro locais, como sejam: a rua Prof. Manuel José Pereira, rua 19 de Junho e Av. dos Bombeiros Voluntários.

Paralelamente, assistiu-se à abertura de um centro comercial situado no casco urbano antigo, possivelmente por razões de prestígio e de centralidade, a par da implementação de uma média superfície comercial, situada na zona Nordeste da vila, área em nítida expansão urbana.

Atualmente, os factores de desenvolvimento continuam a ser centrados no dinamismo termal e económico propiciado pela peculiar situação geográfica, e pelo tecido industrial, mas surgem-nos novos factores resultantes da especulação imobiliária e da especialização do sector terciário.

Esboço histórico-geográfico do aglomerado de Caldas das Taipas

Por António José de Oliveira